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NA
DISCUSSÃO DA MEMÓRIA
Depois da ampla incursão
na estamparia que assegura determinante permanência nas
suas criações, Fernanda Cruzick alvidra um olhar incomum
sobre o mundo e principia, em 2001, interesse por
questões memoriais presentes na série Reflexos de
Chão criando releituras de ladrilhos hidráulicos,
“obsessão decorativa do final do século XIX e início do
XX, que povoam pisos de edificações e espaços urbanos”
como observa o arquiteto Marcos Olender.
Inicialmente referenciada
na memória dessas peças hidráulicas da Construtora
Pantaleoni Arcuri (Juiz de Fora), Cruzick aventa
criações que recuperam esse objeto que, por seus
aspectos materiais e gráficos, alcança um status
de relevante personagem e torna-se um arquétipo da
arquitetura industrializada. Esses objetos, fios
condutores de sua criação, exploram infinitas
possibilidades das sobreposições decretadas por recortes
que derivam inovadoras formas resultantes do jogo entre
transparência e opacidade, tingidas por tintas que,
gradativamente, se intensificam.
Nos conjuntos
Multiplicidade e Games, idealizados no
entre-tempos do calendário, preserva-se, em comum, além
do ânimo temático, o aspecto ótico e lúdico, legados de
permanência sugestionada na excelência da gênese dos
objetos dispersos, indiferentes e instigadores,
neo-dadaístas de Leonino Leão, criador contemporâneo
reverenciado por Cruzick ao longo de sua carreira.
Nas
reminiscências do décor da cidade de outrora, Cruzick
concebe malhas (teias) cromáticas a examinar o ardiloso
universo da cor, reavendo-lhe harmonias contrárias ao
senso comum prenunciando por pochoir, técnica
recorrente da série Jazz, de Matisse, criações que
concertam articulações combinatórias dos variantes
diálogos possíveis entre as peças.
Fernanda Cruzick constata
aguçado sentido no esquecimento do objeto
memorialístico, impregnado de conhecimento e suplicante
na reeducação visual, concebendo ressignificações
inovadoras e expectações para o óbvio.
José Alberto Pinho Neves
Professor do Instituto de Arte e Design da Universidade
Federal de Juiz de Fora
Diretor do Museu da República Itamar Franco – Juiz de
Fora |